Por Gabriel de Lima

Realizado todos os anos, o Vestibular da Unicamp – gerido pela Comissão Permanente para os Vestibulares (Comvest) – é um dos mais concorridos exames nacionais para o ingresso em uma universidade. Multidisciplinar por natureza, existem inúmeras dúvidas, vindas dos(as) candidatos(as), em torno da prova de redação, sobretudo com a variação de gêneros textuais requeridos e a atualidade das temáticas abordadas. Desde que surgiu, o exame de admissão universitária da Unicamp passou e ainda passa por inúmeras reformulações, que seguem revolucionando o modo como se avaliam, em solo brasileiro, o desempenho e a escolaridade de um indivíduo. Ao oferecer duas propostas de redação, a Comvest busca conceder ao vestibulando e à vestibulanda uma maior participação na realização da prova.

A criatividade e a singularidade daquele(a) que se candidata a um dos 66 cursos de graduação da Unicamp são determinantes para a produção textual exigida, dado que as inúmeras decisões a serem tomadas na escrita da redação delineiam o perfil desse(a) futuro(a) estudante universitário(a). Como já é tradição, a Editora da Unicamp publica, em parceria com a Comvest, o livro Redações do Vestibular da Unicamp 2022, lançamento que segue o projeto editorial adotado nos vestibulares anteriores. Contendo 30 textos produzidos por candidatos(as) aos mais diversos cursos, o “livrinho”, como é carinhosamente conhecido, visa à divulgação das redações que “realizaram com sucesso as tarefas de leitura e escrita”.

Havendo a possibilidade de atribuir, erroneamente, um viés didático e metodológico à publicação dessa obra, o professor José Alves de Freitas Neto, diretor da Comvest, ressalta a heterogeneidade dos textos escolhidos, sendo que o diálogo entre a “individualidade dos(as) candidatos(as)” e os suportes ofertados pela prova podem servir como um exemplo aos futuros vestibulandos. A necessidade de uma leitura crítica não somente do tema proposto, mas também de sua própria realidade enquanto um sujeito social, impele o(a) candidato(a) a produzir um escrito amplamente reflexivo, que torna evidente a sua perspectiva pessoal da problemática debatida na redação e, acima de tudo, do mundo em que habita.

Na edição de 2022 do Vestibular, o processo de ingresso disponibilizou duas propostas de redação, das quais apenas uma podia ser escolhida para a elaboração do texto. A primeira delas foi “escrever um post (‘textão’) assumindo a máscara discursiva de um/a famoso/a digital influencer adolescente de 15 anos, em resposta a opiniões sobre seu sucesso na internet”; transitando entre o narrativo e o argumentativo, esse texto deveria estar apoiado em um transtorno digital contemporâneo: a relação desacompanhada ou irrestrita de crianças e adolescentes com as redes sociais. A partir disso, alguns pontos em comum podem ser destacados nas Redações do Vestibular da Unicamp 2022, como a externalização da singularidade do(a) candidato(a) na concepção de “perfis diversos de digital influencers”, a visibilidade social concedida a pessoas marginalizadas ou com alguma necessidade especial e a incriminação de casos de cyberbullying.

No segundo modelo sugerido, foi solicitada a criação de “um manifesto a ser lido na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), [colocando-se] no papel de um/a estudante universitário/a brilhante que teve uma bolsa de Iniciação Científica (IC) rejeitada por restrição orçamentária”, um problema vigente que explicita a deficiência de políticas públicas de fomento à ciência e à pesquisa no Brasil. Não se detendo apenas ao caso específico, a maioria dos vestibulandos projetou os prováveis danos futuros que esses cortes de investimentos podem ocasionar, além de utilizar, como exemplificação, a total dependência da importação de ciência estrangeira durante a pandemia de coronavírus.

Além das 30 produções textuais, existe na obra uma Apresentação que, assinada por José Alves de Freitas Neto e por Márcia Mendonça – coordenadora acadêmica da Comvest –, discorre sobre a dimensão socioeducativa que está imbricada na publicação anual de Redações do Vestibular Unicamp. Em seguida, alguns docentes do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL-Unicamp) – Cynthia Agra de Brito Neves, Daniela Birman e Alfredo César Barbosa de Melo – redigiram uma Introdução ao livro, que disseca tanto as propostas de redação do Vestibular 2022 quanto as escolhas estilísticas, de linguagem e de reflexões sociais que os(as) candidatos(as) fizeram.

No final da leitura dessa coletânea, os leitores poderão compreender, de fato, o enfoque contido na prova de admissão à universidade campineira, na medida em que, ao prezar pela individualidade de cada vestibulando(a) – em vez de exigir um perfil preestabelecido –, a Comvest consegue “oferecer oportunidades de formação para um público cada vez mais amplo” e plural. Sendo um espaço público, é perceptível uma democratização no acesso à Unicamp, que está refletida na autonomia que as propostas de redação fornecem a todos(as) os(as) candidatos(as), sendo estes(as) os(as) verdadeiros(as) protagonistas de seus textos.

Com um preço acessível, Redações do Vestibular da Unicamp 2022 pode ser utilizado em salas de aula, durante o ensino médio, como forma de exemplificar a multidisciplinaridade e a prática de inteirar-se sobre a atualidade, que representam peças-chaves na realização da prova de redação; ademais, o livro também pode contribuir para a promoção de debates sociais não somente no âmbito educacional e acadêmico, mas em todas as esferas da sociedade.

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