As múltiplas facetas do patrimônio

Por Gabrielle da S. Teixeira

Há muito tempo vemos construções antigas e monumentos serem tombados como patrimônios que figuram a história de lutas sociais e territoriais que modificaram nosso país e é de valor para nossa comunidade. Entretanto, os dias atuais são marcados por debates polêmicos em torno do que deve ser visto como uma fonte de memória de um povo e quais são os verdadeiros indivíduos a serem homenageados: são os heróis ou os vilões desse país? 

Pensando nessa questão, o livro Dicionário temático de patrimônio: Debates contemporâneos propõe que seus leitores analisem o que definimos como patrimônio e qual a sua ligação com a afirmação de identidade e a história de um povo. Além disso, a proposta da obra é a de avançar nas definições já vistas nesse campo de estudo ao apresentar suas atualizações. 

Com a colaboração de diversos autores especializados em patrimonialização, o livro pretende evidenciar como o conceito não se reduz a construções históricas e antigas, mas é constantemente ressignificado a fim de seguir os novos valores que circundam nossa sociedade, nossa cultura e a diversidade natural do país.  Dessa forma, os colaboradores são vistos como interpretadores da história geográfica, pois evidenciam em suas pesquisas como a ideia de patrimônio está associada às lutas políticas, econômicas e territoriais. 

A obra é organizada por duas especialistas que identificaram a necessidade de redefinir conceitos que já não condizem com a atual população brasileira cuja constante transformação luta por uma democratização entre seus povos. Aline Carvalho é coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Unicamp (Nepam–Unicamp) e pesquisadora na área do Patrimônio e História Ambiental. Cristina Meneguello é membro fundadora do Comitê Brasileiro de Preservação do Patrimônio Industrial (Ticcih–Brasil) e coordenadora da Olimpíada Nacional em História do Brasil para escolas públicas e particulares.

O livro dispõe as definições de patrimônio de forma diferenciada, dinâmica e didática. Por meio de verbetes, é revelado como tal conceito pode ser encontrado em diferentes campos e como vem sendo modificado com diversas pesquisas atuais. Os verbetes foram compostos de maneira que atendessem os recortes temáticos, tais como ideologia, cultura e natureza. O formato possibilita ao leitor transitar livremente pelo conteúdo, visto que todas as entradas têm associações com outras definições. 

Para a elaboração dos verbetes, foi proposto um desafio: os autores deveriam escrever um texto sucinto, com linguagem objetiva, didática e sem citações, e indicar possíveis leituras complementares para o conhecimento do leitor. Dessa maneira, os textos são de fácil compreensão, rápidos de serem lidos e repletos de referências.

A obra é dividida em duas partes. A primeira, “Definições”, contém 18 verbetes e visa orientar “nossa compreensão sobre a memória, a natureza, os acervos, a educação patrimonial, os diferentes tipos de patrimônio material e imaterial, as políticas e os instrumentos que os constituem”. Aborda, também, os institutos responsáveis pela constituição do que é patrimônio, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Já a segunda parte, “Novos patrimônios, novas questões”, possui 32 verbetes e apresenta os debates, que se iniciaram em 1990, e as atualizações que foram ocorrendo desde então para inclusão de diferentes grupos sociais que ressignificam a definição de patrimônio. Essa divisão entre os capítulos evidencia que há múltiplos caminhos para a análise do patrimônio cultural, que se encontra em constante mudança para atender a diversidade do povo brasileiro. 

“Ao construirmos um olhar sobre a cultura, confrontamos as nossas complexas estruturas conceituais às do nosso objeto investigado, criado por uma multiplicidade de sujeitos que o constituem. Somos os tradutores de um mundo que vai sendo recriado, inclusive por nossas traduções – um valor a mais agregado a este dicionário que aqui se apresenta.”

Durante a composição do Dicionário, foi levado em consideração como as ordens material e simbólica podem estar contidas no que é tido por bem cultural, o que é definido como memória de um povo e, até mesmo, como estão relacionadas com a produção do espaço. Assim, os verbetes têm por objetivo evidenciar como as mudanças culturais se manifestam nos processos contemporâneos, os quais são perpassados por ideologias oficiais, por normas impostas pelas autoridades e por valores atribuídos aos bens, sejam mercadológicos ou simbólicos.

O livro relaciona constantemente o patrimônio com a cultura, a história e a sociedade, e evidencia que ele não deve ser reduzido a um produto comercial, pois simplificar a cultura “enquanto commodity, implica em uma redução interpretativa” de todas as relações impostas nesse campo. Há, também, uma busca em romper com a perspectiva colonizadora, predominante branca e masculina. Logo, Meneguello e Carvalho afirmam que a determinação do que deve ser considerado como patrimônio necessita ter em vista qual é o tipo de sociedade que se deseja construir, isto é, compreender que a definição de valor cultural de um patrimônio é uma atribuição feita por todos os cidadãos, reconhecendo todas as diferenças sociais, étnicas e de gênero. A compreensão do que é patrimônio foi sendo modificada e expandida a partir de debates e confrontos de vozes diferenciadas, sendo uma das grandes conquistas de lutas sociais, como afirmam as organizadoras. 

“Os bens não têm valor em si, mas valores que lhes são atribuídos. Apenas com essa clareza conseguimos abrir espaços para a constituição dos patrimônios vinculados às memórias indígenas, afro-americanas, LGBTs, entre tantas outras. O que permanece é a certeza de que o patrimônio é o modo possível de identificarmos, no passado, os valores existentes, as concepções de espaço, os princípios estéticos, a técnica, o saber fazer, as formas de trabalho, as expressões do coletivo, a construção das identidades e as disputas sociais. O patrimônio é a medida dos entrelaçamentos entre memória e história, poderoso dispositivo de reflexão sobre o passado, o presente e o futuro.”

Em Dicionário temático de patrimônio, o leitor poderá fazer uma leitura rica e detalhada de uma obra escrita por especialistas que, após anos de pesquisa, revelam como o patrimônio está intimamente ligado à sociedade e à história. 

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Dicionário temático de patrimônio – Debates contemporâneos

Organizador: Aline Carvalho e Cristina Meneguello

ISBN: 978-65-86253-27-6

Edição: 1ª

Ano: 2020

Páginas: 272

Dimensões: 16x23x1,5

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