Teorizando o ensino de filosofia e a filosofia do ensino

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Por Luisa Ghidotti Souza

“Minha aposta é que a produção teórica aqui reunida possa servir para a ampliação de um debate relevante não apenas para especialistas em ensino-aprendizado de filosofia no ensino médio, mas para todos e todas que se interessam pela filosofia e por suas interfaces com as questões da educação na contemporaneidade.” 

Filipe Ceppas, Ensaios de filosofia nos trópicos: Questões de ensino e aprendizado, 2019.

Há quem questione a importância de discutir as práticas de filosofia na escola. A pergunta que nos cabe, contudo, é outra: que ensino de filosofia e que filosofia de ensino defendemos? Afinal, no contexto em que nos encontramos a partir da reforma do ensino médio em 2017 – que retirou a oferta de disciplinas da área de ciências humanas dos currículos e cerceou os conteúdos que o professor desenvolve em sala de aula –, não podemos pôr em dúvida a relevância de refletir e reconstruir as práticas de ensino. 

O livro Ensaios de filosofia nos trópicos: Questões de ensino e aprendizado, escrito por Filipe Ceppas e publicado pela Editora da Unicamp no final de 2019, não admite a lei 13.415/2017, responsável por dissolver o ensino das ciências humanas nas escolas de nível básico. A obra discorre sobre filosofia na escola e faz uma defesa do ensino da disciplina, ignorando as mudanças institucionalizadas pela reforma do ensino médio e levando o professor a pensar no propósito e no método de suas práticas educacionais.

O autor faz um movimento teórico passando por diversos filósofos que, ao longo dos séculos, discutiram, em seus contextos, a relação entre filosofia e educação e entre ensino e aprendizado. De “Sócrates a Eduardo Viveiros de Castro”, estabelece-se um diálogo entre os estudiosos que enveredaram pelas discussões a respeito das possíveis intersecções entre o espaço escolar e o fazer filosófico.

O ponto de partida é a negação da ideia de que filosofia significa “seguir um caminho de investigação que é pessoal e intransferível, o diálogo do eu consigo mesmo”, defendida por importantes pensadores como Descartes e Rousseau. Segundo Filipe Ceppas, para pensar o ensino de filosofia é necessário presumir que “o filósofo sempre se dirige a alguém”, assim como os escritos filosóficos não são apenas registros para a memória (como defende Hanna Arendt), mas têm por objetivo a transmissão de ideias: “o transmitir é sempre um convite a um pensamento autônomo, um ‘deixar passar mais além’, que é o sentido etimológico estrito da palavra transmitir”.

Nesse momento da discussão são feitas ponderações em torno da relação entre mestre e discípulo. São questionados o papel do professor e o papel do aluno em eventos de ensino e aprendizagem institucionalizados, nos quais a “transmissão do saber adequada seria a do mestre que tem o domínio da história da filosofia e se faz passar por sábio perante um auditório”. Com isso, o autor intersecciona Descartes, Obiols, Kant e Hegel para pensar sobre autonomia e fidelidade nas relações de aprendizado, sobre as diferenças entre ensinar “história da filosofia e ensinar a filosofar” e sobre a oposição entre “aprender ciência e aprender história”. 

Tais questões são imprescindíveis para o ensino de filosofia, pois levam a uma teorização do que é “filosofia” na escola considerando a natureza estatal das instituições. A rearticulação desses conceitos induz a refletir sobre uma reestruturação do ensino, em que “o desafio não seria tanto o de ensinar filosofia ou a filosofar, mas exercitar o pensamento filosófico com eles e pensar (aprender) o que advém (ou com aquilo que advém) desse encontro”. Sendo “eles” referência a “crianças e jovens”.

Este livro, portanto, reúne renomados teóricos situados em diversos tempos e lugares na história da humanidade e do mundo para pensar o que é transmitir filosofia:

“É curioso perceber que todos os filósofos, quando falam do ensino e do aprendizado da filosofia, nos seus mais diversos aspectos, costumam explicitar, escancarar mesmo, o enraizamento metafórico da linguagem. Assim, Descartes, por exemplo, ao falar sobre o aprendizado de filosofia, lança mão de uma metáfora oceânica (de resto, figura clássica da metafísica nos mais diversos filósofos) – um mergulho no mar que lhe permita chegar ao fundo e dar impulso de volta à superfície –, enquanto Kant prefere as ruínas, os germes e os vermes, como imagens próprias à incompletude e à fragilidade estrutural dos sistemas que herdamos, e a partir dos quais precisamos tentar construir o nosso próprio pensamento, ou a filosofia como uma ciência possível”. 

A articulação teórica deste livro se dá, então, entre o fazer filosófico (enquanto ciência) e o pensar filosofia (enquanto história), de maneira a pensar um espaço educacional que exerça “filosofia” em sua completude e renove os conceitos engessados de professor e aluno. Falar sobre isso no Brasil contemporâneo contribui muito para os debates em torno dos novos projetos em educação que vêm sendo instituídos, na medida em que teorizar a respeito de que ensino de filosofia se defende significa posicionar-se diante do que está sendo gerido pelo Estado em nível educacional.  

Para saber mais sobre o livro Ensaios de filosofia nos trópicos: Questões de ensino e aprendizado, acesse o nosso site!

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Ensaios de filosofia nos trópicos – Questões de ensino e aprendizado

Autor: Filipe Ceppas

ISBN: 978-85-268-1511-7

Edição: 1a

Ano: 2019

Páginas: 280

Dimensões: 14×21

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