por Paula Cruciol
Essencial ao estudante de música é conhecer progressivamente os instrumentos, suas extensões, afinações, recursos, limitações, variações de timbre e possibilidades de combinações entre si: isso é o que afirma Carlos Almada, professor da Escola de Música, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ele é também arranjador, compositor e autor de dois livros fundamentais, únicos no Brasil, que trazem ao ensino de teoria musical propostas inovadoras para estudantes de Música: Harmonia funcional, comentado há algumas semanas aqui, e Arranjo.
Apesar de existirem outras publicações, a maior parte estrangeira, sobre arranjo, elas dificilmente se relacionam à realidade musical do Brasil. O autor comenta que esse foi o principal fator que o inspirou a escrever essa obra. Interessado em aprimorar o ensino de disciplinas essenciais ao repertório dos musicistas, Almada chega a um equilíbrio entre os aspectos que compõem o estudo do Arranjo, oferecendo um painel detalhado e multifacetado, com descrições teóricas e exemplos de aplicação prática.
O livro é dividido em duas partes. A primeira é sobre base rítmica na música popular brasileira e arranjo para sopros. A segunda, sobre arranjo complexo e escrita para vozes, cordas, instrumentos de madeira, metais e percussão, tratamento contrapontístico, texturas instrumentais, criação e variação melódica e acompanhamentos para solistas. Ao expor princípios básicos, Almada pretende fornecer dimensão de importância de cada assunto dentro do ensino musical, chegando a mencionar as disciplinas de Harmonia e Composição, como complementares ao desenvolvimento do arranjo.
Aliás, o estudo da composição está especialmente ligado ao estudo do arranjo, pois ambos tratam da escrita da música. Enquanto o compositor escreve obras novas, criando e definindo sequências melódicas, o arranjador faz a adaptação de uma música a diversos instrumentos e vozes, considerando as particularidades tanto da melodia quanto de cada um dos componentes de sua execução — uma nova composição de uma música pré-existente. No entanto, a diferença mais marcante no estudo das duas disciplinas reside no fato de que o ensino de composição é sistematizado, mas o de arranjo não.
Essa ausência de sistematização ocorre devido às particularidades da música popular, à qual o arranjo está tradicionalmente ligado. Dessa forma, Almada tece sua crítica ao ensino de disciplinas relacionadas à música popular, que, apesar de não ser o assunto principal do livro, está presente em sua obra:
“Alguns elementos da escrita musical (dinâmica, expressão, fraseado, tempo) são relegados injustamente a um plano inferior de importância por uma boa parte dos arranjadores. Enquanto uns consideram erroneamente seu uso restrito à chamada música erudita, outros tratam com tanto descaso que fazem com que a correta execução de uma partitura dependa muitas vezes do talento, do bom gosto e, principalmente, da boa vontade do intérprete, o qual, mesmo contando com todos esses atributos, dificilmente poderá ter a visão geral e o controle sobre a peça que o arranjador possui (ou que, pelo menos, deveria possuir)”.
Assim, Almada orienta o mergulho dos estudantes por matérias fundamentais e, com exercícios, auxilia que eles as dominem separadamente a fim de, então, relacioná-las para compor arranjos. Os exercícios, nessa jornada didática, são essenciais, diz o autor, pois fazem que os musicistas se acostumem a imaginar o fraseado e a dinâmica próprios de cada trecho da música e para cada instrumento atuante na execução. Apesar de ser um assunto complexo, o professor começa com uma paleta de cores simples: preto e branco. Essa metáfora é empregada para dizer que o arranjo de menos elementos tende a ser mais simples e é por ele, então, que o ensino começa. Dessa maneira, ao longo do livro, cada vez mais elementos e detalhes são acrescentados, passando por todas as divisões de instrumentos quanto ao meio de produção de som.
Por fim, o autor destaca o contraponto, pouco desenvolvido na disciplina de arranjo, segundo Almada, por ser considerado “assunto de músico clássico”, postura que prejudica o processo de aprendizado musical. Por outro lado, sintetizadores, sequenciadores e demais eletrônicos e/ou computadorizados foram deixados de lado, porque as especificidades do ensino para esses instrumentos ficariam facilmente desatualizados em relação aos avanços tecnológicos — ainda que essa ausência no livro não prejudique o musicista, visto que toda a base para o desenvolvimento de arranjos é bem desenvolvida.
A obra de Carlos Almada conduz o estudante pela disciplina, fornecendo um panorama completo da teoria e das aplicações práticas essenciais ao desenvolvimento do arranjador, mas também pode ser um guia aos professores que trabalham o assunto em sala.
Arranjo
Autor: Carlos Almada
ISBN: 978-85-268-0879-9
Reimpressão: 5ª – 2018
Edição: 1ª
Ano: 2000
Páginas: 368
Dimensões: 21×28