Por Thaissa Ribeiro

Se você acha que o que se entende por moral sempre teve o mesmo significado para a sociedade, está enganado. Os conceitos sobre moralidade e ética variaram ao longo do tempo e são de extrema importância para os estudos sociais atuais. Foi justamente a fim de apresentar um panorama dessa vasta literatura que os antropólogos Didier Fassin e Samuel Lézé organizaram uma antologia com o que há de mais relevante sobre o assunto.

Por séculos, a moral foi apenas relacionada à religião e à filosofia. Mesmo existindo diferenças entre esses campos, algumas preocupações eram comuns, como: O que é o bem? Quais virtudes devem ser cultuadas? Qual código de conduta adotar em determinada situação?

A moral e a ética têm sido invocadas em conversas e ambientes diversos, por exemplo: de políticos, espera-se um comportamento moralizado tanto na vida pessoal como na profissional; de criminosos, exige-se que prestem contas de seus crimes. Após períodos ditatoriais, comissões da verdade são instauradas, numa tentativa de identificar os culpados e reparar fraturas sociais. Essas comissões pressupõem que, uma vez que as pessoas tomem conhecimento dos horrores que foram cometidos, os remorsos dos autores farão parte de um processo de reconciliação – ainda que esse pressuposto nem sempre se materialize, e ainda que muitas vezes a reconciliação pareça ser outro modo de designar a impunidade.

Também as finanças já não encontram sua única justificação oficial no desenvolvimento do capitalismo e no enriquecimento dos especuladores; poupadores e acionistas preferem investir em fundos éticos associados à solidariedade ou à ecologia. Paralelamente, no âmbito social, as pessoas afetadas por discriminações já não ficam entregues à própria sorte. São vítimas legítimas e não estão mais submetidas à lei do segredo que, durante tanto tempo, prevaleceu em famílias, igrejas e centros esportivos.

O discurso sobre direitos humanos se fortalece pouco a pouco, e o observador da atualidade não deixa de notar o quanto a moral e a referência à ética fazem diferença nos acontecimentos. Mas nem sempre essas palavras tiveram o poder e o significado que possuem atualmente.

O cenário composto por esse conjunto de fenômenos não é resultante de lógicas comuns nem de revoluções isoladas. Com mais de dois mil anos de lastro, o estudo da moral procura analisar como tais fatos se desenvolvem e se inserem no espaço público.

A obra A questão moral é uma compilação de textos com visões diferenciadas do tema. Está dividida em cinco partes – Fundações da Moral, Posições, Descrições, Confrontações e Prescrições –, cada uma associada a uma discussão crítica composta por introdução e um conjunto de textos específicos. Foram selecionadas contribuições de mais de 40 autores, entre os quais: Durkheim, Montaigne, Nietzsche, Foucault, Malinowski e James Scott.

O projeto não tem intenção de analisar os sinais das questões morais atuais na sociedade e decifrar seus sentidos, mas sim a de proporcionar ao leitor um recuo espacial e temporal; o primeiro, pela evocação de lugares em que diversas preocupações da atualidade já eram objeto de análises, e o segundo, teórico e crítico, convidando quem lê às terras das ciências humanas e sociais, a começar pela filosofia.

O livro é uma ótima pedida para os estudantes de ciências humanas, os curiosos e os apaixonados pelo tema. Confira:

A questão moral – Uma antologia crítica

Organização: Didier Fassin e Samuel Lézé

Tradução: Lara Christina de Malimpensa

ISBN: 978-85-268-1452-3

Edição: 1ª

Ano: 2018

Páginas: 560

Dimensões: 16 x 23