A fama dos povos consumidores de carne humana está no Livro da Vez

canibais

Por Julia Franco

Absorto no encantamento das mulheres selvagens, o marinheiro pensa tê-las atraído com seu poder de conquistar muito mais do que terras. As índias prendem sua atenção com seus corpos nus e grande poder de sedução, distraindo-o, enquanto uma quarta índia se aproxima. Descuidado e imerso na atração das belas selvagens, o conquistador nem imagina que será consagrado como prato principal de um banquete canibalesco.

Esse cenário, que poderia fazer parte de um roteiro cinematográfico, é, na realidade, uma gravura documentada em uma carta de Américo Vespúcio enviada à Europa em meados de 1509.  Assim como esse, inúmeros relatos de casos de canibalismo na América e na África serviam como alerta aos futuros colonizadores, difundindo a fama dos povos consumidores de carne humana. Tais relatos fazem parte do acervo estudado pelo historiador colombiano Yobenj Aucardo Chicangana-Bayana, na obra Imagens de Canibais e Selvagens do Novo Mundo – do maravilhoso medieval ao exótico colonial (séculos XV – XVII), publicada pela Editora Unicamp.

A partir da exposição e análise das centenas de imagens e narrativas de viagens às terras longínquas e inexploradas dos séculos XV a XVII, o livro apresenta um estudo completo sobre a suposta “barbárie” cometida pelos povos canibais e a “superioridade” do homem branco – como era representado o confronto dos selvagens e civilizados, retratando as ideologias coloniais presentes na história ao longo dos séculos.

Por meio de testemunhos banalizando as cenas de canibalismo, os colonizadores europeus mostravam que os índios e os negros necessitavam da intervenção do povo “civilizado” em suas terras para prevenir as guerras e traições, práticas comuns em virtude do indominável instinto dos habitantes do Novo Mundo.

Assim, o levantamento feito por Chicangana-Bayana expõe a imagem que se difundiu das práticas canibalescas, divergente dos rituais regrados que ocorriam, de fato, entre os ameríndios e que chegavam a ser um feito honroso para os integrantes da tribo. Além disso, traz em pauta questões sobre as imagens relacionadas à era medieval, nas quais apresentavam práticas antropofágicas que se diferenciavam dos rituais de canibalismo ameríndio, mas muito se confundiam com eles.

Ao leitor interessado nas questões sobre comportamento humano, essa obra excepcional permite a análise de diferentes posicionamentos a partir de diversas fontes, como pinturas, desenhos, gravuras e textos. E engana-se quem pensa que apenas os canibais eram insólitos. As estratégias dos colonizadores para controlar as terras e as riquezas dos nativos e a maneira como lidavam com o desconhecido também dizem muito sobre a conduta do lado “civilizado” da história.  

Desse modo, Imagens de Canibais e Selvagens do Novo Mundo dialoga com a antropologia e ainda analisa as mudanças ocorridas nas convenções ao longo dos séculos XVI e XVII sobre o assunto, integrando textos e imagens em um estudo singular sobre a prática dos povos que compunham a Terra dos Canibais.

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Imagens de canibais e selvagens do Novo Mundo – Do maravilhoso medieval ao exótico colonial (séculos XV-XVII)

Autor: Yobenj Aucardo Chicangana-Bayona

Tradutor: Marcia Aguiar Coelho

ISBN: 978-85-268-1385-4

Edição: 1ª

Ano: 2017

Páginas: 264

Dimensões: 16×23

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