A educação brasileira em tempos de reformas políticas

Por Gabriel de Lima

No século XIX, ainda sob o governo imperial, o Brasil possuía uma grande população de analfabetos que refletia a disparidade econômica e social existente em toda a sociedade brasileira. Com a tomada do poder pelos republicanos, a problemática educacional continuou presente no panorama nacional, o que preocupava os novos governantes. O inconformismo de certos grupos políticos – como o liderado por Getúlio Vargas, futuro governante do Brasil – alterou a disposição da política nacional, mesmo antes dos eventos de 1930 que depuseram o presidente Washington Luís. Os indícios de “ruínas de um ancien régime” implicaram modificações na estrutura pública e nas políticas adotadas pelos estadistas, sendo a educação uma das áreas mais visadas nesse processo reformista.

Acerca disso, a transição para um novo governo “exigia uma nova política de educação”, que foi profundamente debatida tanto por partidários quanto por opositores à Velha República. “O movimento de renovação educacional que, a partir de 1927, ocorreu, primeiro, na capital federal e, depois, em São Paulo” formulou um projeto designado “Escola Nova”, com a pretensão justamente de mudar e inovar o sistema de ensino nesses dois estados. Expondo o entusiasmo inicial e as muitas decepções dos educadores brasileiros nos anos 1920 e 1930, o historiador André Luiz Paulilo assina a obra Escola Nova: políticas de reconstrução – a educação no Rio de Janeiro e em São Paulo (1927-1938), publicada recentemente pela Editora da Unicamp.

O autor, ao partir dos intelectuais “signatários do Manifesto dos pioneiros da educação nova”, pretende traçar as fases das reformas que se sucederam nas secretarias educacionais de ambos os estados brasileiros. Paulilo frisa também que, nos tópicos referentes ao espaço e ao tempo, houve “outras expressões nacionais” de uma reestruturação do ensino que antecederam ou ultrapassaram o eixo Rio-São Paulo – como em “Minas Gerais, entre 1926 e 1930”. Contudo, a obra centra-se nessas duas localidades, preocupando-se, sobretudo, em promover um estudo completo das ideias programáticas e ações que partiram dos principais integrantes da “Escola Nova” – um conceito tido primeiramente como empolgante e que, depois, passou por diversas renomeações e reformulações de seus objetivos originais.

O “rompimento com o passado, [o espírito] de mudança” impeliram não somente os funcionários da administração pública, mas igualmente mobilizaram “muitos docentes nas tarefas de propaganda e popularização” do ideário reformista, que acarretava, segundo Escola Nova: políticas de reconstrução, na defesa do papel civilizador da educação. Paralelo a isso, com a compreensão de que o velho modelo de ensino deveria ser repensado ou até descartado, houve a necessidade da “definição de novos parâmetros de referência para a prática docente”, sendo que isso se consistiu na obrigatoriedade de um “credenciamento educacional” para os professores e, ademais, na “criação de órgãos especializados” – inserem-se, nesse caso, as Superintendências de Ensino no Rio de Janeiro.

Para escrever a obra, o historiador preocupou-se em expor o linguajar técnico compartilhado pelos pioneiros da reforma educacional, buscando demarcar as diferenças entre as conceituações teóricas e a prática administrativa desses personagens no comando do sistema de ensino. Assim, o livro, dividido em três partes, levou em conta os períodos de formação, difusão e recepção sobre a “noção de Escola Nova”. As duas primeiras partes tratam, de forma epistemológica, das discussões técnicas e pedagógicas que cercaram as propostas reformistas de “Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Anísio Teixeira e Almeida Jr.”. Na terceira parte, Paulilo demonstra como, durante e após o processo de implementação de reformas no ensino, teve-se uma reavaliação por parte desses mesmos intelectuais sobre a concretude – ou não – da “Escola Nova”.

Professor titular na Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (FE-Unicamp), André Luiz Paulilo leciona e pesquisa sobre História da Educação, assunto abordado em um dos livros publicados por ele anteriormente Políticas públicas de educação: a estratégia como invenção. Rio de Janeiro, 1922-1935. No livro recém-publicado, o historiador continua a analisar o contexto educacional do sudeste brasileiro, reunindo um material bibliográfico profícuo e esclarecedor que remonta desde os últimos instantes da Primeira República até a instauração do Estado Novo.

Dos primeiros alvoroços até a superação teórica dessa “velha novidade”, o projeto reformista permaneceu sendo debatido e reformulado, de acordo com Paulilo, mesmo após décadas depois das iniciativas originais. Isso mostra como “Escola Nova” deu início, em escala nacional, a um pensamento técnica e pedagogicamente competente que questiona, desde os anos 1920, o panorama educacional brasileiro – seus problemas estruturais e sociais que atravessam toda a história do Brasil Moderno. De modo igual, o empenho dos signatários iniciais deve ser admirado, ainda mais por eles terem se colocado em oposição “ao clientelismo e à troca de favores [com] uma certa regulação ocupacional nos cargos e funções do ensino”.

No trânsito entre São Paulo e Rio de Janeiro, o historiador brasileiro evidencia as leituras polissêmicas que foram feitas acerca da “Escola Nova”, não deixando de assinalar a enorme importância dessa iniciativa como porta de entrada para a democratização do acesso a um estabelecimento de ensino público e de qualidade. Com as “tentativas […] de dar autonomia profissional ao professorado e um novo ímpeto descobridor à educação”, Escola Nova: políticas de reconstrução – a educação no Rio de Janeiro e em São Paulo (1927-1938) apresenta uma visão ampla e questionadora sobre o que pode ser considerado como o período de germinação da educação brasileira moderna – sendo esta marcada, desde o início, por suas particularidades extraescolares e por seus muitos desafios pedagógicos. Para saber mais sobre o livro, visite o nosso site!

Escola Nova: políticas de reconstrução – a educação no Rio de Janeiro e em São Paulo (1927-1938)

Autor: André Luiz Paulilo

ISBN: 9788526815681

Edição: 1a

Ano: 2022

Páginas: 288

Dimensões: 16 x 23 cm

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