Por Beatriz Burgos

“A expressão ‘tripé universitário’ é empregada em referência aos três pilares de sustentação dessas instituições: Ensino, Pesquisa e Extensão”, aponta Rubens Bedrikow, autor da obra Extensão universitária na Vila Paula. No entanto, na Constituição Federal, o uso da expressão “terceira missão” em referência à Extensão, citada por último, indicaria um lugar de menor relevância para esse pilar quando comparado ao Ensino e à Pesquisa que, tradicionalmente, costumam receber maior destaque dentro das universidades.

A obra Extensão universitária na Vila Paula é fruto de tese de livre-docência de Bedrikow, vinculada à área de Medicina Comunitária da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. Essa obra propõe-se a discutir a experiência concreta e real de indissociabilidade desses pilares a partir de programa de extensão universitária em andamento, desde janeiro de 2018, na Ocupação Vila Paula, comunidade de ocupação urbana de alta vulnerabilidade social, localizada em região periférica do município de Campinas-SP.

Bedrikow é médico formado pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e professor associado do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Entre suas principais áreas de interesse estão a prática em saúde na atenção primária, a história da medicina, a educação médica e a extensão universitária. “Se, por um lado, o Ensino e a Pesquisa representam funções primárias ou atividades principais da universidade, cabe à Extensão uma função singular, única, pois é a dimensão que melhor cumpre o papel social da instituição”, diz o autor.

Na obra, ele retrata a origem e a evolução do programa de extensão universitária na Ocupação Vila Paula, durante quatro anos. Fora do campus universitário, o projeto foi desenvolvido em conjunto com a ocupação, a partir de trocas dialógicas e transformadoras entre a universidade e a comunidade. Docentes e alunos propuseram-se a adquirir novas informações sobre o modo de viver da comunidade, pouco conhecida pelo grupo antes de janeiro de 2018, quando se iniciaram as atividades extensionistas. “O conhecimento foi sendo construído mediante múltiplos, frequentes e continuados encontros entre extensionistas e moradores, dentro de um processo que não se completa e não se encerra. Esse conhecimento não é único, mas sim singular, a partir de variadas experiências de cada pessoa.”

Dessas trocas, emergiram demandas e temas que culminaram em investigações científicas e experiências pedagógicas inovadoras. Em sete capítulos, desafios como a curricularização da Extensão e o engajamento social de instituição superior são discutidos à luz das teorias da Pedagogia Crítica de Paulo Freire, da Aprendizagem pela Interação Social de Vygotsky e da Clínica Ampliada e Compartilhada de Gastão Wagner de Sousa Campos.

No primeiro capítulo, o leitor encontrará informações sobre conceitos e sobre a evolução histórica da Extensão Universitária, Pedagogia Crítica e Aprendizagem pela Interação Social, e abordagem crítica do método clínico. Nos capítulos seguintes, serão relatadas as ações de extensão universitária no território da Ocupação Vila Paula, com ênfase nas experiências de integração entre Ensino e Extensão.

O autor, ainda, nas “Considerações finais”, traz conclusões da pesquisa e levanta possíveis soluções para as discussões desenvolvidas ao longo da obra. As propostas e estratégias são analisadas sempre à luz do cenário sociopolítico e econômico atual do país, principalmente no território onde o programa de extensão Vila Paula acontece, em contexto de grande pobreza e iniquidade de acesso a direitos sociais básicos, como moradia digna. 

A conjuntura atual do país, caracterizada pelo aumento da população pobre, desempregada e residindo em favelas e ocupações urbanas, requer das universidades maior compromisso social e fortalecimento da interação dialógica com a sociedade, com participação discente. As ações de extensão, em suas diferentes modalidades, têm a capacidade de responder a tal demanda e devem, portanto, ser incentivadas e valorizadas pelas instituições de ensino superior. 

Para Bedrikow, um possível caminho para que haja aproveitamento e valorização das diversas ações de extensão em andamento, bem como das que ainda serão criadas, seria sua inclusão numa Disciplina de Projetos Integradores, cuja carga horária pudesse ser considerada válida em qualquer curso da universidade.

Assim, a partir de ação extensionista desenvolvida com uma comunidade de alta vulnerabilidade social, Extensão universitária na Vila Paula busca trazer contribuições à Extensão e ao Ensino e analisar práticas pedagógicas em alguma medida inovadoras e singulares. Com linguagem clara e objetiva em suas análises e trazendo, em cada argumento e articulação, impressionante embasamento teórico e contextual, a obra cumpre com maestria seu objetivo. A leitura destina-se a alunos e docentes interessados em práticas integradoras entre Ensino e Extensão, mas não deixa de ser enriquecedora para qualquer um interessado em política acadêmica, em projetos sociais e no futuro da universidade brasileira, uma vez que traz, como um todo, enorme contribuição para a pesquisa social no país.

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