Por Luisa Ghidotti Souza

“Esse est percipi” – Berkeley.
A filosofia ganha novos rumos na sociedade da tecnologia da informação. O percurso histórico que levou o sistema capitalista à sua forma high-tech no século XXI conta com uma ressignificação das maneiras que os indivíduos sentem e percebem as coisas no mundo. Mas que sistema é esse, afinal? A dialética marxista, a psicanálise freudiana, a teologia de Berkeley, o existencialismo heideggeriano, todos contribuem para uma análise da dimensão filosófica da revolução burguesa, mas nenhum poderia prever a guinada comunicacional que intensificou os dispositivos do capitalismo. O autor de Sociedade excitada: Filosofia da sensação, Christoph Türcke, faz com maestria uma análise das relações entre o modo de produção contemporâneo e as tecnologias da informação, por meio da elaboração do conceito de paradigma da sensação.
Türcke é pensador alemão herdeiro da escola de Frankfurt, que atua como docente há décadas, lecionando, inclusive, como professor visitante na Universidade Federal do Rio Grande do Sul no início dos anos 1990. Sociedade excitada é seu livro mais renomado, que fez dele grande referência da filosofia contemporânea. Ele desenvolve uma leitura dos limites existenciais dos sujeitos imersos na compulsão da emissão – efeito fisiológico do sensacionalismo –, a partir de uma retomada dos primórdios da cultura e do significado de “sensação”.
Segundo o autor, por muito tempo a experiência da sensação remeteu à percepção em seu sentido mais natural: tocar, cheirar, ver, ouvir, sentir o gosto. Nas culturas primitivas os rituais de inserção dos indivíduos nas sociedades procuravam levar as sensações ao extremo, de maneira que a socialização era moldada pelo terror, pelo choque. Ao longo do tempo, o sentido de “sensação” tornou-se mais denso, extrapolando os limites da percepção e relacionando-se a questões mais subjetivas, psíquicas para além de fisiológicas.
Com o aumento das ofertas de serviços e produtos, da concorrência mercadológica e da quantidade de coisas que se tornaram mercadoria dentro da lógica do capital – inclusive a arte, transformada em produto sob a égide da indústria cultural –, há uma busca frenética por emitir informação de uma maneira chamativa e atrativa, que cause sensação. Quanto mais chocante, mais perceptível em meio a um oceano de informações disponíveis. Assim, percepção e sensação ganham um novo motivo, uma nova abrangência, mas usam dos mesmos artifícios de tempos passados.
O sensacionalismo é um novo paradigma e é preciso investigar um longo período histórico para assim o entender.
“Por mais que a sociedade altamente tecnologizada possa envolver seus membros de maneira assustadoramente íntima, ela [uma mudança de perspectiva] já vem de muito longe. As tendências mais recentes correspondem apenas a algo de meramente superficial, a uma moda, o “último grito”. Agora, porém, cabe indagar o que se expressa ou o que irrompe, nessas tendências, de longamente acumulado, retido, não resolvido. É necessário pesquisar as fontes a partir das quais a moderna lógica da sensação surgiu, e elas encontram-se lá onde o paradigma da sensação tem sua origem histórica: na Renascença, uma época de mudança.”
Türcke entende a sensação como um dispositivo, no sentido foucaultiano do termo, envolvendo, assim, sistemas bem estruturados. Para alcançar uma compreensão sobre ela, o autor faz, no primeiro capítulo, um tour pelas relações que esse dispositivo estabelece. Investiga o modo de produção, a comunicação, a tecnologia e as relações sociais modernos no que tange às teorias da sensação.
Ele segue examinando com minúcia esse processo de mudança. Faz um recorte histórico da Renascença à Revolução Francesa para mostrar como a sociedade moderna se tornou uma massa de excitação.
No terceiro capítulo retrocede ainda mais no tempo, a fim de entender as sensações primevas, ou seja, aquelas mais objetivas, mais fisiológicas: “que penetram na carne e no osso”.
No capítulo seguinte, Türcke retorna à modernidade, aplicando ao êxtase audiovisual contemporâneo um diagnóstico pautado nessa investigação de suas origens. E alcança, no quinto capítulo, o ponto máximo de sua teoria: a sensação é fisiológica e interfere no sistema neural. Quando se afasta de sua função objetiva – a percepção –, passa a cumprir também funções subjetivas ligadas ao prazer, à identidade, à própria existência. Ser é perceber, ser é ser percebido. Assim, a sensação torna-se um vício quando a realidade já não é mais suficiente e estar no mundo só é possível com a existência inserida neste dispositivo. E, como todo vício, causa dependência e síndrome de abstinência.
“A metralhadora audiovisual se revelou como sua injeção coletiva e ela própria como uma substância altamente libidinosa, que adquire todo o conteúdo daquilo que na terminologia religiosa significa fetiche, até chegar ao ponto da irreconhecibilidade. Fetiches são sintomas de abstinência, ou seja, sucedâneos de algo que fora dolorosamente privado.”
Sociedade excitada: filosofia da sensação é uma daquelas obras inescapáveis, com tema tão universal e tão íntimo que poderá ser lida em muitas partes do mundo, durante um longo período sem perder sua relevância. Türcke oferece à modernidade a leitura que a teologia, a dialética estruturalista, a psicanálise e a linguística não fizeram: pensar os efeitos da tecnologia audiovisual nos indivíduos e as possibilidades futuras do modo de produção capitalista.
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Sociedade Excitada: filosofia da sensação
Autor: Türcke, C
ISBN: 9788526808560
Ano de publicação: 2010
Edição: 1
Formato: 23,00 x 16,00 x 2,00 cm.
Nº de páginas: 328 pp.
Peso: 500 g.