Por Luís Fernando Moreira da Costa
A conjuntura política atual é caracterizada por uma inflexão que tende a um “endurecimento” das relações políticas, sociais e culturais. No âmbito nacional, esse processo é marcado pela crise política deflagrada a partir dos protestos de rua de 2013, mas cujas origens são mais antigas e incluem o surgimento dos pentecostais na cena pública. Esse movimento geral pode ser observado tanto em uma visão macroscópica, atenta aos eventos internacionais, quanto em uma visão microscópica, como nas disputas do poder legislativo brasileiro.
Numa abordagem interdisciplinar, Conservadorismos, fascismos e fundamentalismos examina a conjuntura política atual num duplo movimento. De um lado, reflete sobre os usos e as definições das categorias que dão título à obra; de outro, utiliza-as para investigar seus respectivos contextos, contrastando a capacidade analítica de tais termos com a realidade da qual tratam. Desse modo, os autores realizam, à sua maneira, a articulação desses conceitos com seus aspectos indissociáveis: sua fundação histórica, seu poder simbólico e sua potência evocativa.
A origem histórica de tais termos está associada a uma conjuntura específica cuja complexidade não restringe os usos que fazemos desses conceitos, uma vez que o poder simbólico intrínseco a essas categorias nos permite transpor seu tempo. Assim, o caso originário pode servir de suporte e parâmetro para a análise presente, por suas semelhanças. Ao mesmo tempo, os conceitos podem ultrapassar sua capacidade analítica, transformando-se em instrumento de acusação, ou seja, veículo que exprime a indignação de alguns em relação ao comportamento de outros.
Inspirando-se nesse modelo, cada capítulo segue uma abordagem teórico-metodológica específica, de acordo com a área de pesquisa do respectivo autor. No capítulo de abertura, intitulado “A onda conservadora na política brasileira traz o fundamentalismo ao poder?”, o cientista político Joanildo Burity parte do surgimento dos pentecostais na cena pública para discutir o papel da religião na política, com destaque para dois elementos principais: um regime de publicização da religião e “uma nova governamentalidade emergente nucleada no conceito de tolerância”.
No segundo capítulo, um salto temático transfere o centro do debate para o pleito eleitoral que elegeu Donald Trump. A partir da pergunta-título, “Donald Trump é fascista?”, o cientista político Alvaro Bianchi e o historiador Demian Melo deslocam o debate da análise política para discutir a pertinência dos conceitos envolvidos, utilizando-se do contexto como base para avaliar a efetividade de cada um. De volta ao cenário brasileiro, o terceiro capítulo, “Os protestos e a crise brasileira: Um inventário inicial das direitas em movimento (2011-2016)”, centraliza as reflexões nas manifestações políticas de 2011 a 2016. Desse modo, a cientista política Luciana Tatagiba analisa os protestos a fim de averiguar os atores coletivos envolvidos, suas relações com as instituições e suas concepções de democracia.
No quarto capítulo, “Crise, alucinose e mentira: O anticomunismo do nada brasileiro”, o psicanalista Tales Ab’Sáber considera o cenário público atual como “um momento extraordinário de revelação do Brasil”, referindo-se à onda de protestos em prol do impeachment de Dilma Rousseff. No entanto, sua abordagem se destaca do resto do livro por sua articulação com elementos estéticos oriundos tanto do cinema nacional como da literatura, das notícias de jornal e dos cartazes em protestos.
No quinto capítulo, “Antibolivarianismo à brasileira”, da filósofa Yara Frateschi, é discutido o papel do “antibolivarianismo” na reação parlamentar à Política Nacional de Participação Social (PNPS), a qual prevê a atuação de organizações coletivas da sociedade civil no cenário político-institucional. A filósofa mostra como essa oposição e o projeto de decreto legislativo 1.491, que visa interromper a validade da PNPS, representam mais do que uma derrota do governo federal, uma vez que comprometem “a própria possibilidade de aprofundamento e ampliação da democracia brasileira que, sabem os seus opositores, depende do empoderamento dos movimentos sociais e das minorias políticas, bem como da possibilidade da sua participação na formulação de políticas públicas”.
Por fim, no último capítulo, “Deuses do parlamento: Os impedimentos de Dilma”, o antropólogo Ronaldo de Almeida expõe, como argumento central, a ideia de que o país segue caminhos na vida política, social e cultural que, apesar de diversos, convergem em alguns aspectos. Devido a essas “conexões parciais”, o movimento geral tenderia ao conservadorismo.
Conservadorismos, fascismos e fundamentalismos Análises conjunturais
Organizador: Ronaldo de Almeida e Rodrigo Toniol
ISBN: 978-85-268-1455-4
Edição: 1ª
Ano: 2018
Páginas: 200
Dimensões: 14×21