Por Ana Carolina Pereira

Há séculos, os seres humanos causam mudanças no planeta devido a suas ações, além disso, a busca desenfreada pelo lucro ocasionou desgastes ambientais sérios na Terra. Diminuição dos mananciais, extinção de espécies, inundações, erosões, poluição em geral, mudanças climáticas, destruição da camada de ozônio, chuva ácida, agravamento do efeito estufa, destruição de habitats naturais e tantos outros impactos ambientais causados pela atividade humana causaram a diminuição da qualidade de vida da população e contribuíram para o surgimento de doenças em humanos e em outros seres vivos. 

Para discutir sobre esses assuntos e sobre a nova era em que estamos vivendo, a obra O acontecimento Antropoceno – A Terra, a história e nós foi publicada pela Editora da Unicamp em parceria com a Quina Editora. Essa obra foi escrita pelos autores Christophe Bonneuil e Jean-Baptiste Fressoz, com tradução para o português de Marcela Vieira. Bonneuil é pesquisador e professor de história da ciência no CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique) e na EHESS (École des Hautes Études en Sciences Sociales). Ele publicou a obra Prédation: nature, le nouvel eldorado de la finance (Paris, La Découverte, 2015) em coautoria com Sandrine Feydel. Fressoz é historiador da ciência, da tecnologia e do meio ambiente, pesquisador no CNRS e professor na EHESS. Ele é autor de L’Apocalypse joyeuse (Paris, Seuil, 2012) e Sans transition. Une nouvelle histoire de l’énergie (Paris, Seuil, 2024).

A obra O acontecimento Antropoceno – A Terra, a história e nós inaugura a coleção Ponto Crítico da Editora da Unicamp, coordenada pelo professor Luiz Marques – autor de Capitalismo e colapso ambiental, organizador de A fábrica do antigo e tradutor de Vida de Michelangelo Buonarroti – e pela historiadora Néri de Barros Almeida – autora do livro O Mediterrâneo medieval reconsiderado e também coordenadora da coleção Estudos Medievais. A coleção Ponto Crítico “oferece um panorama diversificado de estudos e debates sobre as crises ambientais e seu enfrentamento realizados no Brasil e no exterior” e convida o leitor a refletir sobre a interdependência e a inter-relação entre direitos humanos, direitos da natureza e justiça climática.

Segundo o livro O acontecimento Antropoceno – A Terra, a história e nós, estamos vivendo em uma era geológica chamada Antropoceno, marcada pela ação do homem no planeta. Os autores pontuam que essa nova era “é o sinal da nossa potência, mas também de nossa impotência” e que o planeta passou a ser “um tecido vivo empobrecido e artificializado, impregnado de uma imensidão de novas moléculas químicas sintéticas capazes de modificar até mesmo nossa descendência”, devido à quantidade de moléculas de dióxido de carbono despejadas na atmosfera com a queima de carvão e de petróleo, além de outras formas de poluição.

Dessa forma, o livro propõe o debate sobre essa nova era e convida o leitor à reflexão de “novas humanidades ambientais que ajudarão a renovar nossas visões do mundo e nossas formas de viver juntos na Terra”. Assim, os autores trazem diversos teóricos para enriquecer o debate. Entre estes, está Paul Crutzen – químico da atmosfera e vencedor do Prêmio Nobel por seu trabalho sobre as camadas de ozônio –, quem cunhou o termo “Antropoceno”. Crutzen sugeriu o ano de 1784 como marca do início dessa nova era, ano da patente de James Watt da máquina a vapor, símbolo da Revolução Industrial.

[…] tomar o Antropoceno como um acontecimento é constatar que atravessamos a porta de saída do Holoceno. Chegamos a um limite. Tal constatação deve revolucionar as visões de mundo que se tornaram dominantes com a afirmação do capitalismo industrial baseado na energia fóssil. Que narrativas históricas podemos oferecer sobre este último quarto de milênio que nos ajudarão a transformar nossas visões de mundo e habitar o Antropoceno de forma mais lúcida, respeitosa e equilibrada? Eis o propósito deste livro.

Para desenvolver a discussão, o livro é dividido em três partes. A primeira parte é composta por dois capítulos e apresenta o que significa o Antropoceno e suas implicações para as nossas visões de mundo e para as Ciências Humanas e Sociais. A segunda parte, também composta por dois capítulos, “aponta para os problemas da narrativa ‘geocrática’ que hoje domina o Antropoceno”. A terceira e última parte, com sete capítulos, propõe revisitar a história de 1780 até a atualidade para discutir diversos elementos-chave que nos levaram até a era geológica em que estamos hoje, como a energia e o CO2, o papel dos militares no Antropoceno, a fabricação da sociedade de consumo, entre outros elementos.

O acontecimento Antropoceno – A Terra, a história e nós, em sua Conclusão, intitulada “Sobreviver e viver no Antropoceno”, recapitula o que foi discutido nos capítulos anteriores e reforça a noção de ser necessário entender a nova era geológica como algo que não irá passar como uma “crise ambiental” passageira, mas como uma nova condição do planeta. Partindo dessa ideia, os autores pontuam a necessidade de se aprender a sobreviver e a viver no Antropoceno, trazendo ações que devem ser empregadas, como dar lugar às múltiplas narrativas em vez de uma única narrativa hegemônica. Os autores argumentam a importância de se desenvolver o senso crítico e de se libertar de “instituições repressivas, de dominações e de imaginários alienantes” para viver o Antropoceno.

A obra O acontecimento Antropoceno – A Terra, a história e nós é um convite à reflexão sobre o planeta, o meio ambiente, o sistema capitalista e diversos outros elementos que permeiam o sistema de poder do mundo atual. Com uma linguagem clara e, ao mesmo tempo, técnica e acadêmica, pode interessar estudiosos de áreas diversas devido à interdisciplinaridade que o assunto da obra detém. De ambientalistas a cientistas sociais, o Antropoceno deve estar entre seus estudos, e, por isso, essa obra é tão relevante para o momento atual do Brasil e do mundo.

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