Uma experiência de divulgação científica: a produção textual como chave para a extensão universitária

Ana Alice Kohler

A Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, foi responsável por instituir diversos direitos inalienáveis aos brasileiros, assim como regularizar normas envolvendo órgãos públicos, como as universidades, que passaram a ser pensadas a partir do chamado “tripé universitário”, formado por ensino, pesquisa e extensão. Dos três elementos do tripé, o último é certamente o que tem sua importância menos reconhecida pelo público geral, mas vem ganhando destaque nas iniciativas do meio acadêmico. A extensão, nesse sentido, figura como uma das maneiras pelas quais a universidade exerce sua função social, mantendo-se em contato contínuo com a comunidade da qual faz parte e prestando serviços a ela. É nesse contexto que se insere a obra recém-publicada pela Editora da Unicamp Divulgação científica, produção textual e práticas extensionistas, dos professores do Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas (IEL/Unicamp) Anna Christina Bentes, Caio Mira e Anderson Carnin.

O livro faz parte da Série Extensão Universitária, “voltada à divulgação das contribuições, teóricas e metodológicas, das iniciativas de caráter extensionista” da Unicamp. As obras reunidas na série são fruto de projetos de divulgação, formação e inovação científica e refletem a “capacidade de diálogo e de trabalho conjunto da Universidade com a sociedade” nas mais variadas áreas do conhecimento, como música, farmácia e linguagens. O título, nesse sentido, se insere nesse contexto ao apresentar uma iniciativa real que integrou práticas de extensão universitária e de divulgação científica na Unicamp.

Anna Christina Bentes é graduada em Letras pela Universidade Federal do Pará (UFPA), mestre em Linguística pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), doutora em Linguística pela Unicamp, com pós-doutorado em Antropologia pela Universidade da Califórnia, Berkeley. Atualmente, é professora do Departamento de Linguística do IEL/Unicamp e coordenadora do Centro de Pesquisas Margens. Caio Mira é mestre e doutor em Linguística pela Unicamp e professor do Departamento de Linguística do IEL/Unicamp. Além de integrar o Centro de Pesquisas Margens e o Grupo de Pesquisa Cogites, atua como pesquisador nas áreas de Linguística Textual, Análise da Conversação e Estudos de Narrativas Orais. Anderson Carnin é professor do Departamento de Linguística Aplicada do IEL/Unicamp, atuando na área de Educação Linguística em Língua Materna, tanto na Graduação em Letras quanto no Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada.

Em Divulgação científica, produção textual e práticas extensionistas, eles apresentam uma iniciativa que tem como propósito o “estabelecimento de relações concretas entre práticas extensionistas e práticas de divulgação científica na universidade”: a disciplina HL337 – Laboratório de Produção Textual II (LabTxt), ofertada pela primeira vez em 2019 no IEL/Unicamp. O projeto, que contou com 291 alunos matriculados, gerou mais de 60 vídeos e 24 podcasts, sendo resultado de um trabalho conjunto de diversos professores e pesquisadores. A obra apresenta, portanto, ao longo de cinco capítulos, a extensão universitária como um todo, a importância da divulgação científica como prática extensionista e, ainda, um exemplo prático de uma experiência que uniu esses dois elementos – divulgação científica e extensão universitária – por meio da produção textual.

O primeiro capítulo da obra, intitulado “A extensão universitária no Brasil: histórico, avanços e desafios”, apresenta um panorama geral do surgimento, do funcionamento e das iniciativas relacionadas à extensão universitária no Brasil, com base em documentos como os do Fórum de Pró-Reitores de Extensão Universitária. Dessa maneira, os autores propõem como “principal diretriz a interação dialógica para as atividades extensionistas”, de modo que o diálogo e o contato entre a produção de conhecimento oriunda de dentro e de fora da universidade sejam essenciais. A partir disso, surge a necessidade do reconhecimento dos saberes e das contribuições dos “atores sociais externos à comunidade acadêmica”, que guia as principais recomendações e os princípios para a elaboração de projetos e cursos, explorados ao fim do capítulo.

Já o segundo capítulo do livro, “Comunicação e divulgação científica: contornos, ênfases e propósitos desde a perspectiva dos estudos da linguagem”, se debruça sobre a outra face da temática central: a divulgação científica. Nele, os autores discutem os chamados “campo científico” e “cultura científica”, debatendo, em última análise, o papel da divulgação nesses contextos. Além disso, o leitor é apresentado ao jornalismo científico, suas similaridades e diferenças em relação à divulgação científica propriamente dita, e à convergência entre esses dois gestos em relação à ciência e a determinados gêneros do discurso, como “sínteses, resumos, resenhas, relatos de experiência, resenhas descritivas, podcasts, videoaulas, vídeos de outra natureza, entre outros”.

Em “Práticas de divulgação científica: um olhar para o cenário brasileiro”, terceiro capítulo da obra, os autores apresentam uma análise mais específica sobre o contexto da ciência no Brasil. São discutidos os principais dilemas da divulgação científica para as universidades, ambiente em que tais práticas apresentam grande impacto social. Como exemplos para a análise, são apresentados o Jornal da USP, o Projeto LER e algumas iniciativas da própria Unicamp. Além disso, os textos que compõem o capítulo investigam a polifonia como marca desse tipo de comunicação, em que há a “presença de múltiplas vozes e perspectivas”. Segundo os autores, isso se dá pela preocupação dos divulgadores em elaborar materiais que sejam compreendidos e que reconheçam os “interesses e os conhecimentos do público-alvo”. Dessa maneira, estabelece-se um diálogo contínuo entre a produção dos divulgadores e o contato do público com a divulgação científica.

A experiência central para a escrita de Divulgação científica, produção textual e práticas extensionistas é tematizada, desse modo, no quarto capítulo do livro, “Laboratório de Produção Textual: uma experiência de entrada no mundo acadêmico-científico e de exercício da divulgação científica”. Nele, os autores defendem a importância do desenvolvimento dos dois modos de comunicação científica – o voltado à comunidade e aos gêneros acadêmicos e o da divulgação científica, direcionado ao público exterior à universidade – na formação dos estudantes de graduação. Para isso, Anna Christina Bentes, Caio Mira e Anderson Carnin detalham o funcionamento da disciplina Laboratório de Produção Textual II (LabTxt), ofertada no primeiro ano do curso de Letras da Unicamp, que consiste na elaboração de materiais de divulgação científica baseados em teses ou dissertações (os principais gêneros acadêmicos). Dessa maneira, eles destacam como “a produção da resenha descritiva e do produto de divulgação científica – vídeo ou podcast – permite aos alunos desenvolver habilidades de comunicação da ciência por meio de ações de DC em nível intracampo […] e também extracampo”.

Por fim, o último capítulo da obra trata dos caminhos a serem seguidos no âmbito da divulgação científica como prática extensionista. Nele, os autores destacam algumas possibilidades para o futuro da extensão universitária por meio de bolsas de iniciação à divulgação científica e prêmios e feiras que deem visibilidade a projetos com impacto na comunidade externa à universidade. Além de apresentar alguns dos benefícios da divulgação científica produzida pela universidade, espera-se ainda que a experiência relatada – o LabTxt – “possa inspirar outras formas e possibilidades de articulação entre ensino, pesquisa e extensão na universidade”. De forma geral, portanto, Divulgação científica, produção textual e práticas extensionistas parte da perspectiva de que:

A beleza reside na percepção das diferenças e das afinidades no interior desse mundo diverso, que engloba a ciência e todos os outros saberes sociais. Aproximações sucessivas, surpresas constantes, assombramento e alegria com o novo e com o desconhecido, alguma estranheza. É o que nos propicia o contato com o universo acadêmico-científico construído até hoje, universo este que nos diferencia e que nos constitui de tantas maneiras. Que esta obra possa animar ainda mais a vontade de experienciar a aproximação entre mundos e pessoas que diferem em conhecimento e poder.

Para saber mais sobre a obra, acesse nosso site!

Divulgação científica, produção textual e práticas extensionistas

Autores: Anna Christina Bentes, Caio Mira e Anderson Carnin

ISBN: 9788526817340

Edição: 1ª

Ano: 2025

Páginas: 200

Dimensões: 14 x 21 cm

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