Maria Eduarda Peloggia Lunardelli

O uso especulativo da razão em vista da natureza conduz à necessidade absoluta de alguma causa suprema do mundo; o uso prático da razão em vista da liberdade conduz também a uma necessidade absoluta, mas somente das leis das ações de um ser racional como tal.

Nascido em 22 de abril de 1724, na antiga cidade de Königsberg, Prússia (atual Kaliningrado, Rússia), e membro de uma família alemã, Immanuel Kant se consagrou como um dos pensadores mais relevantes e influentes da filosofia ocidental nos tempos modernos. Sendo um dos principais nomes do movimento intelectual e filosófico ocorrido na Europa no século XVIII, o Iluminismo, Kant tratava principalmente de uma teoria da moral, na qual a razão seria o fundamento da moral e as questões de estética seriam derivadas de um atributo de julgamento sem interesse. Em um cenário de grandes avanços no campo das ciências e de supervalorização da razão, o filósofo buscava compreender a maneira como o homem garantiria a sua autonomia, pautada na moralidade e na religião, em meio às ameaças que o desenvolvimento acelerado das ciências oferecia, mas sem reprimir tais avanços. 

Nesse contexto, o estudioso alemão dá início à publicação de seus trabalhos logo em 1747, com a obra Pensamentos sobre o verdadeiro valor das forças vivas, na qual inicia suas reflexões sobre a metafísica. Contudo, seus estudos também contribuíram de forma relevante para outras áreas do conhecimento. Ao longo dos anos, publicou artigos não apenas sobre ética, metafísica, razão e moral, mas também sobre as ciências naturais – como suas discussões sobre a rotação da Terra, o surgimento e a evolução do Sistema Solar – e sobre geografia, com textos a respeito do terremoto ocorrido em Lisboa, em 1755. Porém, foi somente a partir da década de 1780 que passou a publicar suas maiores obras filosóficas. 

Sua primeira grande obra, como filósofo e estudioso já bem consolidado no meio acadêmico, foi Crítica da razão pura (1781), na qual discute a forma como se pode conhecer as coisas, sintetizando tradições aparentemente antagônicas: o racionalismo e o empirismo. Entretanto, foi apenas em 1785 que Kant publicou sua primeira obra sobre filosofia moral. Fundamentação da metafísica da moral, que se propõe a compreender a moralidade em seu princípio fundamental, além da forma com que ela se aplica aos homens, segue até os dias de hoje sendo um dos mais influentes – e também um dos mais complexos – trabalhos desse campo da filosofia. 

Diante de grande relevância e dificuldade da obra, Osmyr Faria Gabbi Júnior, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/Unicamp), empenhou-se em tornar esse estudo mais descomplicado e acessível ao realizar uma nova tradução dele. Assim, o professor graduado em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela mesma instituição é responsável pela execução de uma tradução comentada dessa obra de Kant, na qual apresentou como principal objetivo a compreensão do texto e seu relacionamento com outras obras do autor, tendo em vista a utilização do livro em uma série de aulas ministradas em cursos de graduação em Filosofia, durante três semestres seguidos. 

Essa obra é trazida ao público pela Editora da Unicamp, em edição bilíngue (alemão-português), de modo a oferecer ao leitor a possibilidade de recorrer tanto ao texto original quanto à tradução ou às notas para o estudo e o entendimento do conteúdo. Nesse sentido, Fundamentação da metafísica da moral é composto por uma nota ao leitor – na qual o tradutor e comentarista apresenta os objetivos da obra –, um prefácio e três seções de desenvolvimento da tese – essas seções possuem uma organização que busca elucidar o texto parágrafo por parágrafo, com um trecho do texto original, seguido de sua tradução e explicação. 

Fundamentação da metafísica da moral, com a sua proposta de elucidar um dos textos de filosofia de maior importância no mundo ocidental, faz parte de uma coleção de livros que possui o mesmo objetivo. A Coleção Fausto Castilho – Estudos, voltada para os amantes e estudiosos da filosofia, é uma reunião de obras consolidadas no meio acadêmico em versão traduzida e comentada, com a finalidade de fomentar as pesquisas na área. Por isso, os livros dessa coleção são uma excelente recomendação não apenas para os alunos de graduação, mas também para professores e pesquisadores.

Além do título abordado neste texto, o catálogo da Editora da Unicamp também conta com mais duas obras relacionadas ao grande filósofo: Kant e o poder de julgar (2020), escrito pela filósofa Béatrice Longuenesse, e Manual dos cursos de lógica geral (2014), que integra a Coleção Fausto Castilho Multilíngues. 

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