Maria Vitória Gomes Cardoso

Segundo o pesquisador Ivan Kowaleski, em entrevista concedida à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, o filósofo Giambattista Vico pode ser considerado “o mais importante pensador italiano depois de Galileu Galilei. Um personagem singular”. Nascido em Nápoles, em 23 de junho de 1668, Vico foi um influente filósofo, poeta, historiador e jurista, tendo falecido na mesma cidade, na noite de 22 de janeiro de 1744. Justamente por sua relevância para as humanidades é que Sertório de Amorim e Silva Neto e Vladimir Chaves dos Santos organizam a obra Epistolário, publicada pela Editora da Unicamp.

Sertório de Amorim e Silva Neto concluiu sua graduação em Filosofia na Universidade Federal de Uberlândia, em 1999. Entre 2000 e 2003, desenvolveu sua dissertação de mestrado no Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Em 2006, iniciou o doutorado em Filosofia na Universidade de São Paulo (USP), defendendo sua tese em 2010, na qual explorou o pensamento de Giambattista Vico e discutiu a articulação, na obra do filósofo napolitano, dos conceitos de razão e barbárie. 

Vladimir Chaves dos Santos é graduado, mestre e doutor em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas e tem pós-doutorado pela Università degli Studi di Napoli Federico II. Atualmente, é professor adjunto na Universidade Estadual de Maringá e possui ampla experiência na área de Filosofia, com ênfase em História da Filosofia. Entre seus principais temas de pesquisa, está a filosofia de Giambattista Vico, e atualmente ele se dedica à tradução das obras latinas do filósofo.

Desse modo, os organizadores utilizaram todo seu conhecimento teórico sobre Giambattista Vico para compilar e publicar essa obra. O livro apresenta uma seleção do epistolário do filósofo napolitano, contendo 31 cartas e 5 escritos menores, além de um Prefácio do historiador italiano Fabrizio Lomonaco e uma Apresentação introdutória. A tradução das cartas e dos escritos menores foi realizada por equipes do Grupo CNPq de Estudo da Filosofia de G. Vico da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e do Projeto de Extensão Entre Filosofias Antigas e Modernas da Universidade Estadual de Maringá (UEM). As equipes foram compostas por pesquisadores da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), da Universidade Estadual de Maringá (UEM), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio).

A obra integra a Coleção Fausto Castilho de Filosofia – Série Multilíngues, que publica textos fundamentais da História da Filosofia em seu idioma original – nesse caso, o italiano – acompanhados de tradução para o português. No livro, os organizadores esforçaram-se para recriar a pontuação, os longos períodos, o ritmo, a sonoridade, as figuras de linguagem e a riqueza estilística da prosa de Vico, cuja construção artística é notavelmente singular. Sobre o critério de escolhas das cartas, os organizadores relatam:

As cartas e outros escritos de Vico foram selecionados segundo o critério da relevância filosófica e biográfica. No caso específico das cartas, levou-se em consideração pelo menos um dos seguintes critérios: ou a sua relevância (i) biográfica, como as cartas que tratam da recepção das obras de Vico e da sua fortuna pessoal, ou (ii) estilística, as mais aptas a ilustrarem as habilidades literárias e retóricas de Vico, ou (iii) heurística, nas quais o filósofo frequenta e ampara a investigação de temas e problemas abordados em suas obras. Foi com base sobretudo nesse último critério que os escritos menores de Vico entraram na presente edição.

Giambattista Vico foi um filósofo político, retórico, historiador e jurista italiano, amplamente reconhecido como um dos grandes pensadores do período iluminista. Ao longo de sua vida, lecionou na Universidade de Nápoles, enfrentando diversas dificuldades financeiras. Lendo suas cartas, podemos notar que era uma pessoa que entendia muito das letras e da filosofia, citando desde Platão até Dante. No seu escrito “Juízo sobre Dante”, presente no livro publicado pela Editora da Unicamp, Vico oferece uma análise da Divina comédia, destacando que essa obra-prima deve ser apreciada por três aspectos: como um registro da história dos tempos bárbaros da Itália, como uma fonte dos belíssimos falares toscanos e como um exemplo de poesia sublime.

Um dos aspectos centrais da filosofia de Vico é a metafísica, entendida por ele como a ciência que tem por objeto a mente humana. A partir disso, a metafísica estende-se a tudo o que o ser humano pode conceber ou pensar. Segundo Vico, essa ciência não se limita à especulação abstrata, mas desce até as artes e ciências, iluminando e fundamentando todas as áreas do saber humano. Segundo Fabrizio Lomonaco, autor da Introdução do livro, a metafísica de Vico está profundamente ligada ao conceito de certum (do latim), pois é apenas a partir da certeza dos fatos – e da sua relação tensa com o universal, que não pode ser reduzido ao simples dado empírico – que se pode alcançar a verdade.

O autor descreve a metafísica de Vico como a “metafísica do gênero humano”, título também de uma coletânea que ele organizou com Humberto Guido e Sertório de Amorim e Silva Neto, que aborda a filosofia de Giambattista Vico. A ordem universal a ser decifrada nessa metafísica deixa, assim, de ser a ordem cósmica, passando a ser a ordem civil, construída pelos homens por meio da dignidade de seu agir. Para Vico, o foco da metafísica não reside na investigação da estrutura do cosmos ou do universo físico, mas na compreensão da história, da cultura e das instituições humanas como um processo de desenvolvimento que segue suas próprias leis e lógicas.

Epistolário é, portanto, uma obra essencial para os estudiosos de Filosofia que já admiram ou pretendem conhecer o ilustre filósofo Giambattista Vico. As cartas presentes no volume revelam sua intelectualidade, aspectos de sua vida e de sua escrita filosófica e poética. Além disso, as correspondências elucidam o contexto histórico e cultural da época. Para aqueles que buscam uma imersão na obra de Vico, Epistolário é um recurso indispensável.