Romance de Lima Barreto é uma das leituras obrigatórias para o Vestibular Unicamp 2025

Por Rafaela Neres Poiani

Em 13 de maio de 1881, no Rio de Janeiro, nasceu Afonso Henriques de Lima Barreto, uma das figuras mais importantes da literatura brasileira. Em sua breve trajetória literária, o escritor revolucionário publicou romances, sátiras, contos, crônicas e uma vasta obra em periódicos, principalmente em revistas populares ilustradas e periódicos anarquistas do início do século XX. Dentre seus livros, destacam-se Recordações do escrivão Isaías Caminha, Triste fim de Policarpo Quaresma e Clara dos Anjos

Lima Barreto nasceu logo após a publicação de Memórias póstumas de Brás Cubas – marco no Realismo brasileiro – e morreu poucos meses depois da Semana de Arte Moderna – inauguração oficial do Modernismo brasileiro. Para fins de análise, ainda que alguns classifiquem suas produções literárias entre o período de transição do Pré-Modernismo ao Modernismo, são evidentes as referências encontradas em seus escritos ligadas diretamente às transformações político-sociais, como a abolição do trabalho escravo em 1888 e a Proclamação da República em 1889. 

A literatura do escritor carioca foi marcada por uma intensa crítica às elites conservadoras, ao autoritarismo, ao preconceito contra a população afrodescendente e às condições precárias em que vivia grande parte da população. Por isso, tinha como pressuposto político uma “literatura militante”, caracterizada pela insubmissão aos modelos consagrados pela tradição, como forma de combate às oligarquias republicanas. Assim, contrária à linguagem rebuscada e pouco acessível ao leitor comum, e diferente da tradição, sua literatura trazia diversas formas de expressão, em que num mesmo texto poderia haver fusão de outros gêneros e formas.

O autor de O triste fim de Policarpo Quaresma ainda hoje é uma das vozes mais críticas da literatura produzida no Brasil, no início do século XX, o que justifica o fato de suas obras aparecerem constantemente nas listas de leitura obrigatória dos vestibulares das principais universidades do país. A exemplo disso, está o Vestibular Unicamp, que inseriu a obra Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá, recentemente, em sua lista de leituras para o exame de 2025. 

Em 2024, a Editora da Unicamp publicou uma nova edição do romance com uma Apresentação feita pelo professor Manoel Freire Rodrigues, que é doutor em Teoria e História Literária, mestre em Estudos da Linguagem e docente na Universidade do Rio Grande do Norte. Ainda, Rodrigues desenvolve pesquisas na área de Literatura Brasileira, especificamente temas como prosa de ficção moderna e contemporânea, numa abordagem que enfatiza a relação entre forma literária e processo social. 

Publicado pela primeira vez em 1919, a nova edição do romance Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá traz uma abordagem crítica e analítica da obra, já que, na Apresentação de Manoel Rodrigues, o leitor encontrará uma contextualização do período histórico, além dos comentários a respeito da constituição da literatura de Lima Barreto e dessa publicação em questão, com trechos do exemplar como subsídio para a análise. Adicionalmente, o livro traz, nas notas de rodapé, referências a teóricos citados ao longo do texto e elucidações sobre expressões que possam ser desconhecidas pelo leitor.

O título conta com 12 capítulos que podem ser considerados independentes entre si, devido ao fato de não terem relação causal entre eles. A trama, embora aborde diversos assuntos, é sempre acompanhada por duas figuras principais: Augusto Machado, o narrador-personagem, e Manuel Joaquim Gonzaga de Sá, amigo e mestre do primeiro. O enredo gira em torno das reflexões desses dois personagens, que percorrem as ruas e os bairros do Rio de Janeiro, tecendo suas considerações com base nas diversas paisagens com as quais se deparam nas andanças: a natureza, a arquitetura e a “paisagem humana”. 

Como ocorre em grande parte da obra de Lima Barreto, o autor opta por trabalhar com personagens marginalizados, com foco na população pobre. Na narrativa desse romance, elementos autobiográficos e questões sociais misturam-se: Augusto Machado, tal como seu criador, é pobre, mulato, amanuense e sente-se preso e limitado a uma ordem social que o impede de realizar suas aspirações. Conforme se nota nas palavras de Manoel Rodrigues, na Apresentação: “Nesse sentido, o protesto do escritor militante contra a opressão e a injustiça aos desvalidos é, ao mesmo tempo, um grito de revolta contra a própria marginalização, que Lima Barreto retrata em vários livros por meio dos personagens”.

Embora a narrativa seja marcada por um tom desencantado, melancólico e pessimista – devido ao contexto dos personagens –, há também um discurso lírico e crítico através da ironia e da sátira social. Um bom exemplo disso é a biografia de um modesto funcionário público, Gonzaga de Sá, que era oficial da Secretaria dos Cultos. Gonzaga de Sá foi retratado pelo amigo Augusto Machado como homem de espírito livre, que buscava constantemente por conhecimento, apesar do cotidiano medíocre da repartição. Nessa parte, o livro traz um tom de protesto (ainda que mudo), impregnado pelo niilismo na velhice de Gonzaga de Sá, que se ressente por ter dedicado toda sua vida ao serviço burocrático; e, tendo sido privado de desenvolver sua obra de criação, vê-se num ambiente inadequado aos seus ideais de uma ordem orientada por princípios éticos superiores, com valores autênticos, voltada ao cultivo da inteligência crítica e da solidariedade humana.

Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá é, assim, uma obra muito importante, uma vez que traz uma Apresentação crítica que pode auxiliar candidatos ao Vestibular Unicamp 2025na leitura e no estudo do romance; além disso, mostra-se um livro fundamental aos estudiosos da literatura brasileira, sobretudo aos entusiastas da literatura militante de Lima Barreto. 

Adicionalmente, outro exemplar que pode interessar aos entusiastas do escritor carioca é o livro Contos de Lima Barreto, lançado em 2020, que faz parte de uma série bilíngue (português-inglês) da Editora da Unicamp.

Para saber mais sobre o livro, visite o nosso site!

Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá

Autor: Lima Barreto

ISBN: 9788526816336

Edição: 1ª

Ano: 2024

Páginas: 168

Dimensões: 14 x 21 cm

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